Sábado, 6 de Março de 2010

CULTURA E ARTES: «CONTA-SATÉLITE»

 

Assisti na segunda-feira, dia 1 de Março, à apresentação pública do estudo O SECTOR CULTURAL E CRIATIVO EM PORTUGAL de que pode ver o Sumário Executivo aqui. E o documento integral pode ser procurado no GPEARI  entidade que encomendou o trabalho. Neste estudo como noutros que visam este amplo sector, que não se sabe muito bem onde começa e acaba, há uma questão que me preocupa deveras  relacionada com o  SERVIÇO PÚBLICO que ao Estado compete garantir e que fica diluído naquele grande «caldeirão» mesmo quando não é esquecido. Sublinhe-se que  neste estudo  está   escrito como uma das quatro grande componentes desse sector:

 

«O "sector cultural" em sentido restrito, como espaço de afirmação de bens e serviços públicos e semi-públicos onde os "stakeholderas" determinantes são os cidadãos portadores de direitos democrárticos de acesso à cultura».

 

Ora, de há uns anos a esta parte esse serviço público constituia-se como a razão de ser central dos organismos que integram o Ministério da Cultura sendo mesmo o seu elemento organizador. Nas reacções a estes estudos, em regra, esquece-se isto onde há muito para fazer e começa-se a falar nas outras dimensões que, salvo melhor opinião, embora não devam ser ignoradas pelo Ministério da Cultura, antes pelo contrário, terão outros Ministérios que saberão melhor tratar delas. E talvez o contributo que o MC tenha de assegurar no conjunto de todas as componentes seja tratar como deve ser o SERVIÇO PÚBLICO NA CULUTRA E NAS ARTES.

 

Mas isto não é a razão de ser deste post. Quero, isso sim, referir-me à necessidade  de uma "conta-satélite" para o sector que é recomendada no estudo, e com o que não se pode estar mais de acordo. E lembrei-me das recomendações nesse mesmo sentido que foram feitas no seminário realizado em Novembro de 2001, por iniciativa do ISEG e do então  IPAE - Instituto Português das Artes do Espectáculo. Recordemos com destaques nossos:

 

 Cultura e Artes no desenvolvimeto económico e social do País

JOÃO FERREIRA DO AMARAL

 «(...)

  Por um lado a cultura é um fim em si próprio do desenvolvimento e julgo que isso, aliás, distingue muitas outras actividades, mas ao mesmo tempo a cultura é também uma actividade importante para o desenvolvimento agora estritamente económico. Há aqui uma dupla característica que deveria levar a crer que os economistas teriam tido desde sempre muito cuidado em considerar as actividades culturais nos seus estudos económicos. Mas na realidade não se tem verificado, e aliás a Senhora Ministra já há pouco referiu o mesmo, e a culpa tem sido dos economistas. A economia herdou uma tradição do século dezanove que é a do homo economicus, isto é, do indivíduo abstracto que só pensa em termos de critérios económicos e relegou sempre os aspectos culturais para um cesto de coisas menos sérias que não seriam próprias, não seriam dignas da análise económica. Julgo que isto é um erro, e hoje em dia estamos a pagar esse erro, em face de alguns falhanços grandes que as análises económicas têm tido, e muitos desses falhanços radicam nesta subvalorização da cultura e dos aspectos culturais na sociedade.
 Para tratar seriamente da questão em termos económicos, do papel da cultura no desenvolvimento, a primeira coisa que é preciso saber é exactamente o que é que significam hoje em termos económicos as actividades culturais em Portugal, por exemplo, e de facto não sabemos. É uma falha, como aliás em muitos outros sectores, é uma falha que não é só de cá, é em todos os países, provavelmente será, pelo menos, em graus semelhantes ao nosso, que não temos uma visão completa do que significa hoje o sector cultural em termos económicos. Eu julgo que há possibilidades de ultrapassar essa falha em termos da nossa contabilidade nacional, como sabem a nossa contabilidade nacional é o sistema de contas que nos permite avaliar em cada ano como é que se processa a actividade económica do país. Existe hoje um instrumento na contabilidade nacional que são chamados contas satélites que tentam dar uma visão de todo um determinado domínio da actividade económica ou cultural e das suas incidências económicas. Por exemplo existe já feita uma conta satélite para o turismo, isto é, sabemos hoje o que é que significa a actividade turística nas suas diversas componentes. Há contas satélites para outros domínios como por exemplo a cooperação com o exterior, e julgo que era interessante a criação de contas para o sector da cultura, saber exactamente o que é que as actividades económicas relacionadas com a cultura hoje significam. Essas actividades são muito diversificadas, há desde actividades de investimento, por exemplo, quando se faz um auditório ou quando se recupera um monumento,. Há actividades de consumo individual, há actividades de consumo geral da sociedade. Portanto há uma enorme diversidade das actividades culturais e era bom termos uma fotografia daquilo que elas significam efectivamente, e o não se ter já isto feito é mais um sintoma do desleixo dos economistas em relação às actividades culturais.
(...)»
 
Análise dos Trabalhos
João Carvalho das Neves
 «Não vou abusar do vosso tempo porque já resistiram suficientemente, mas como co-coordenador deste seminário e como professor de gestão desta casa, gostaria de salientar alguns dos muitos aspectos importantes que foram referidos durante o dia pelos diversos oradores, em ligação com a teoria e a realidade da gestão das empresas:
 Uma primeira grande conclusão que eu acho que se pode tirar deste seminário é o consenso que existe de que o desenvolvimento tem que ser integrado, no sentido de que não há desenvolvimento económico sem Cultura e não há condições para um crescimento e desenvolvimento da Cultura sem um mercado e uma economia minimamente eficiente. Parece-nos que esta ideia foi transversal, sendo referida de uma forma ou outra, por praticamente a todos os oradores.
 Gostaria de salientar da comunicação da Senhora Ministra Elisa Ferreira as questões relacionadas com a urbanidade e a importância da cultura na criação de um clima propício ao desenvolvimento. A este propósito lembrei-me, que nesta mesma sala, há uns meses atrás, num dos debates comemorativos do nonagésimo aniversário do ISEG, um dos maiores empresários deste país com uma estratégia de internacional de sucesso, referia que, apesar da pouca mobilidade dos portugueses, a sua empresa tinha mais facilidade neste momento em os contratar para trabalharem em Londres, Paris, Madrid ou S. Paulo, do que por exemplo para algumas fábricas que tem no interior e, na sua opinião, isso derivada da facilidade de acesso à cultura nessas grandes cidades. Assim, pode concluir-se que o problema tradicional da economia, quanto ao acesso a mão-de-obra qualificada, acresce nas economias modernas a necessidade de estes quadros terem também acesso a cultura. Parece-me que esta é mais uma das importantes conclusões deste seminário.
 Em relação à comunicação do meu colega Prof. Ferreira do Amaral salientava a importância e a urgência de se criar nas estatísticas nacionais, contas satélite relacionadas como a economia da Cultura, de modo a que se conheça melhor a realidade económica deste sector da economia. Há, sem dúvida, muita dificuldade de se saber qual quantitativamente, o contributo deste sector para a economia nacional. O facto de há uns anos atrás se ter feito isso para o Turismo, permite que se conheçam hoje os factores induzidos e de desenvolvimento que o turismo tem, por exemplo, em relação a um conjunto de outras actividades. Isto é, o Turismo é muito mais do que as classificações tradicionais dos sectores de hotelaria ou da restauração. (...)»
 
Apetece perguntar: quantas mais recomendações serão necessárias e quantos anos precisão de decorrer mais para que se crie este instrumento tão necessário? Que além do mais serviria de alavanca para a criação e reorganização de muitos sistemas de informação que o alimentariam.
 
Sobre o seminário um link onde se encontra  divulgação inicial  e outro do Empório Versalhes onde se pode encontrar o Desdobrável do Programa final (como se pode verificar houve alguns reajustamentos, e uma ou duas pessoas não puderam comparecer por exigências de agenda). Mas foi uma iniciativa que correu muito bem com participantes de todo o País. 
 
publicado por MAF às 12:28
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